Verônica Marques*
Em tempos em que os desafios se acentuam, são ampliadas também as chances de novos processos que mesclem criatividade e inovação para a construção de novas formas, funções e emoções para pensar, viver e sentir o Rio de Janeiro em todas as suas especificidades. Dirão os autores clássicos da inovação que é tempo de pensar diferente para encontrar resultados distintos. Já os especialistas com mindset mais disruptivo e um toque de ação em startups vão apontar para a necessidade de ‘hackear’, procurando atalhos e novos pontos de vista inexplorados. Ambos vão concordar que a inovação nesta cidade é uma questão de encontrar um caminho a ser percorrido quando todos os demais não são mais possíveis.
Olhar para a silhueta tão marcante do Rio de Janeiro é compreender suas atuais fraturas sociais, suas rupturas econômicas e sua fragmentação ambiental. É entender a multiplicidade que marca seu povo, em jeitos de ser, de viver e de compreender o mundo. É saber que esta é uma cidade de muitas cidades – partida e hiperconectada – pulsando continuamente suas luzes não importa se em georreferenciamento na Zona Norte ou na Zona Sul. É, acima de tudo, perceber que, na cidade das múltiplas invenções, dos vários lançamentos de moda que retumbaram Brasil a fora, não será possível aplicar um padrão ou um autor único de inovação. Na cidade que faz da mistura uma maneira de levar a vida e os negócios, conceitos muito definidos – mesmos das inovações mais radicais e disruptivas - serão insuficientes.
O Rio de Janeiro precisa do remix para modificar a orquestração dos cenários construídos até aqui. Afinal, as transformações há muito demandadas continuam a ecoar dia após dia nos ouvidos de todxs que são parte deste lugar. Porém, exclusivamente a capacidade de compor misturas não-lineares também não bastará para preencher as lacunas. É preciso que a criatividade dos seus cidadãos, que é figurinha popular e já circula dando as caras por aí, assuma seu papel como publicitária de cenários repletos de mais empatia, como designer de novas possibilidades econômicas a partir da mistura dos talentos locais e como administradora de novos relações ecossistêmicas nesta cidade que é maravilhosa por natureza.
Uma cidade mutante demanda a remixagem criativa para existir porque precisa da inovação dentro da inovação para resistir. No Rio de Janeiro, isso implica contar com todos os autores, as pesquisas e as teorias para se reinventar. Significa ainda ter gente que queria assumir o compromisso de ir do 0 até o 1 em movimentos exponenciais. Indica também a necessidade de impulsionar empresas grandes com propósitos igualmente imensos e pequenos negócios com grandes ideias e impactos. Representa construir novos pactos com o meio ambiente que preenche esta cidade de cores, sons, sabores, cheiros e texturas, tornando-a o que é. Remixar criativamente é ser do Rio pelo Rio.
Um panorama repleto de questionamentos e dicotomias, como o atual, pressupõe o desconhecido. E este traz em si suas contradições. É possível fechar os olhos, velando o potencial de reinvenção desta cidade, ou respirar profundamente e escancará-los para se deparar com a remixagem criativa serpenteando ao tocar dos dedos. Se as escolhas do passado nos trouxeram até aqui e as decisões de agora vão erguer as bases do amanhã, a pergunta é simples: a qual Rio de Janeiro você quer pertencer?
*Professora e Pesquisadora do LEC ESPM Rio
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